Primeiro texto da série "Meus amores"
Eu tive alguns amores. Falando assim parece que foram amores fugazes, sem ou com pouca importância. Mas não. Foram todos contundentes, pontiagudos, marcantes e quase todos, mal cicatrizados.
A maioria chegou com os dois pés no meu peito, como coice de cavalo bravo. Indomável. E, de repente, eu me via assim, dominado, sem conseguir me esgueirar do arrebate. Mas era bom. Foram bons.
Meu primeiro amor, de verdade, era a menina mais doce do mundo. Ela surgiu do meio de outras tantas que dançavam na matinê do clube da cidade, com passos iguais, com uma coreografia sem destaque para ninguém, mas que, ainda assim, a destacou para esse músculo que bate dentro do meu peito. E de repente, ali estava ela: alva, cabelos de petróleo, olhos de camponesa e o sorriso mais meigo e puro que um ser pode sorrir.
Até hoje eu busco palavras que definam aquilo que se apoderou do meu juízo e desgadelhou o que, até então, eu tinha de tino.
Ela era linda. E pra cabá, vez ou outra, também olhava em minha direção. Mas cada vez que nossos olhares se coincidiam na trajetória, minha vontade era de pedir desculpas ao mundo, por ter nascido tão inferior àquele ser e, principalmente, pela ousadia de mirar meu súdito olhar àquela criatura divina, feito unicórnio do bosque encantado.
As peças que a vida nos prega, as vezes suplantam os parâmetros da credulidade e, de repente, ali estava ela, brilhante como uma fada que voa deixando um rastro de luz por onde passa e exalando o perfume das deusas de outras dimensões.
Sim, ali estava ela, ao meu lado. Eu, petrificado como se um frasco de cola tenaz tivesse secado sobre o meu franzino corpo, me impedindo de, sequer, olhar para o lado. No caso, o lado dela.
Mas aquele anjo que espalhava pó de pirlimpimpim cansou de esperar por uma reação minha e - percebendo que eu era presa fácil, animal acuado pelo predador - segurou minha mão, sem o menor pudor e perguntou meu nome.
_Jorge. Eu disse incrédulo, ainda atordoado com o êxtase provocado pela suavidade da voz melodiosa da púbere menina.
Aquela atitude a agigantou para os meus sentimentos, mas, ao mesmo tempo, dissipou a cortina de fumaça que há alguns minutos se apresentava como uma intransponível muralha de pedras, guarnecida por soldados romanos.
Não era.
Eu é que era mole mesmo.
Ainda hoje sinto o gosto de chiclete ping-pong do nosso primeiro beijo. E era o céu encontrá-lá, agora, minha namorada e passar com ela, me exibindo para o meu mundinho.
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